Dois estudos avaliando adultos e adolescentes que receberam a vacina de Covid-19 da Pfizer concluíram que o risco de inflamação cardíaca se elevou no grupo, mas em taxas absolutas pequenas. Como o risco continua pequeno, o benefício da vacina superou em muito a elevação do risco, afirmaram cientistas.
O primeiro dos dois estudos, feito por cientistas da Universidade de Hong Kong, concluiu que o risco de cardite subiu de 2 para 6 casos por cada milhão de recipientes da vacina. O segundo, divulgado na manhã desta terça-feira por uma colaboração de vários institutos no JAMA, revista da Associação Médica Americana, viu uma elevação um pouco maior para 8 casos por milhão, sendo que ambos constataram uma taxa maior em homens e na faixa etária de adolescentes.
Os estudos não permitem conclusões sobre a incidência do problema em crianças, que recebem uma formulação diferente da vacina, com um terço da dose.
A pesquisa chinesa, publicada na revista Annals of Internal Medicine, foi feita com base em dados de 160 pacientes que foram diagnosticados com cardite e 1.500 pacientes saudáveis usados como controle. Foram achados 20 casos com cardite entre quem recebeu a vacina da Pfizer, mas nenhum deles foi parar na UTI. De 133 pacientes que não tomaram a vacina, em contrapartida, 14 foram para tratamento intensivo por Covid-19 e 12 morreram.
Os autores afirmam, porém, que o estudo pode ser importante para planejar a vacinação de adolescentes em grandes populações e a escolha de vacina. O mesmo estudo não viu elevação de cardite para chineses que tomaram CoronaVac na China, por exemplo.
"Nós observamos um aumento no risco para cardite associado ao uso da BNT162b2 [vacina Pfizer/Biontech] particularmente em homens jovens recebendo a segunda dose", escreveram os cientistas de Hong Kong, liderados por Francisco Tsz Tsun Lai.
"Apesar de o risco absoluto ser muito baixo, a elevação do risco deve ser comunicada a médicos e recipientes da vacina, e deve ser levada em conta com relação aos benefícios da vacinação", escrevem. No contexto da pandemia, relatam os pesquisadores, o benefício o imunizante é claro.
No estudo americano, que teve participação dos CDC (Centros de Controle de Doenças) e da FDA (agência reguladora de fármacos), foram incluidos também dados de pessoas vacinadas com o imunizante da Moderna, que usa a mesma tecnologia da Pfizer, o RNA mensageiro. Nos EUA, os cientistas também deixam claro que eventuais riscos de miocardite precisa ser analisado em comparação ao risco de contrair Covid-19 sem vacina.
Além de o coronavírus representar uma ameaça maior, os cientistas afirmam que os poucos casos de miocardite relatados após vacinação não eram tão graves quanto a ocorrência típica desse tipo de inflamação, por infecção.
"Os principais sintomas manifestados se resolveram mais rápido em casos de miocardite pós-vacinação para Covid-19 do que em casos típicos de miocardite viral", escrevem os cientistas, liderados por Mathew Oster, dos CDC. "Eles tipicamente experimentaram recuperação dos sintomas após receberem apenas analgésicos."
Os dados brutos do estudo no JAMA já haviam sido divulgados há alguns meses pelo sistema americano de farmacovigilância. Segundo os cientistas, apesar de a alteração absoluta no risco de ocorrência desse evento adverso ter sido pequena, os dados dos estudos podem ajudar a subsidiar políticas de vacinas em grandes campanhas.
Segundo a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) apesar de serem importantes, os novos estudos não apresentam dados que justifiquem alterações na campanha nacional de vacinação, sobretudo na vacinação de crianças.
— Para o grupo das crianças [abaixo de 12 anos] já existe um relato da farmacovigilância de mais de 9 milhões de doses aplicadas de vacinas de RNA, e foram apenas 11 casos de miocardite, o que representa mais ou menos 1 caso por milhão de dose — afirma o pediatra Juarez Cunha, presidente da SBIm.
Uma preocupação do médico, porém, é que grupos antivacina que vêm crescendo no país usem uma interpretação deturpada dos dados dos novos estudos para espalhar pânico na população.
— É impressionante como esses grupos se mobilizaram e, infelizmente, tiveram apoio até de alguns setores do governo — diz.
— A gente sabe que eventos adversos graves são raros, mas acontecem. Só que as agencias regulatórias já constataram que o benefício suplanta em muito o risco.
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